PAINEL 1 | Políticas Públicas de Habitação em Portugal e na Europa
Isabel Pinto Gonçalves, na qualidade de diretora do Departamento da Habitação e Desenvolvimento Social, da Câmara Municipal de Cascais, abriu o debate sobre as políticas públicas de habitação, com a afirmação de que “as cidades não podem ser coisas fragmentadas”, sendo esse o grande desafio das políticas de habitação que devem ter em conta as questões de “mobilidade, diversidade sociocultural e a sustentabilidade ambiental”.
São essas questões que devem estar sempre presentes em “quem tem a competência para gerir as cidades”, acrescentou a dirigente municipal que, partindo do exemplo de Cascais, “dever ser ao nível local que se implementam as medidas determinadas pelas políticas nacionais”, tendo em conta a “dinâmica que existe num território concreto e as pessoas concretas”, o que exige “compromissos e o envolvimento de todos os atores que atuam no território”, como sejam, políticos, proprietários, moradores, instituições, entre outros.
“Só de uma forma participativa é possível criar uma visão própria para o nosso território, adaptada á realidade local, ainda que enquadrada nas leis gerais, quer nacionais, quer europeias”, concluiu Isabel Pinto Gonçalves.
João Carvalhosa, outro dos oradores presentes no 1º painel, na qualidade de presidente do Comité Português de Coordenação da Habitação Social Housing Europe, começou a sua intervenção, apoiando as palavras de Miguel Pinto Luz, na questão de que é necessário “mudar o paradigma da habitação em Portugal que tem como único foco a habitação social”. “ Em Portugal não há uma política de habitação, mas programas específicos para resolver problemas concretos, como foi o caso do PER, para erradicação das barracas”, acrescentou João Carvalhosa, afirmando, ainda que: “ O modelo de bairro social está esgotado há décadas na Europa, em muitos países não se faz há 30 ou 50 anos”. Para isso Carvalhosa defende que “devemos aprender com a experiência dos outros países europeus e também com os erros que foram cometidos”.
Para João Carvalhosa “a habitação não pode ser vista como um problema da população mais carenciada que só cria políticas não integradoras, nem social nem territorialmente”. “ A resposta em termos de habitação tem que ser vista como um direito para todos e não só para uma determinada faixa da população”, defendeu.
Uma das soluções apontadas por João Carvalhosa e que está em aplicação em toda a Europa é o apoio quer do Estado quer de privados para aquisição de uma habitação ou de rendas apoiadas, com o fim do chamado “bairro social” e do estigma que lhe está associado. “A chave do sucesso das políticas públicas de habitação é a introdução de outros atores que não seja só o poder público que neste momento não tem meios de financiamento para criar mais habitação”, declarou João Carvalhosa.
Ricardo Agarez, com trabalhos publicados sobre políticas públicas de habitação em Portugal nos últimos 100 anos, defende que se devem fazer reflexões e tirar ilações a partir do trabalho que já foi feito, com o objetivo de se iniciar uma nova fase. Assim, alerta para que “apesar da habitação social em Portugal ter má reputação”, muitos dos bairros sociais que hoje existem “estão perfeitamente enraizados no tecido urbano”. Assim, defende que a transformação do parque social edificado não deve passar pela demolição, como alguns defendem: “ alguns destes conjuntos construídos têm qualidades materiais e vivenciais que devem ser aproveitadas” e que “há lições em termos de projetos arquitetónicos que seria lamentável perder”.
Já para Gonçalo Antunes, professor da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, “o termo habitação social está muito estigmatizado em Portugal fruto da ignorância”, realçando que o importante é “as condições de vida que proporcionam, as condições de habitabilidade e a qualidade do espaço público”. Por isso, afirmou Gonçalo Antunes: “ Há bairros que têm génese social, mas deixaram de se enquadrar nesse conceito e são hoje habitados por pessoas de diversas origens e classes sociais”.
Neste sentido, João Carvalhosa, numa segunda intervenção, reforça a ideia de que “acabar com o modelo de bairros sociais, não significa acabar com a habitação social” e de que temos que distinguir os “bairros sociais com dimensão histórica e que precisam de ser reabilitados”, daqueles que “não têm futuro nenhum” e que “perpetuam a pobreza por várias gerações, cuja solução é a demolição”.
Ricardo Agarez levantou, igualmente, o problema da manutenção que é necessária assegurar nos bairros sociais. “ Em Portugal investiu-se muito na construção, mas, muito ou nada na manutenção do edificado e do espaço público”. Ricardo Agarez salientou, ainda, o facto de que só 2% do parque habitacional em Portugal é público, enquanto em outros países europeus a percentagem é de 20% a 40%. Como consequência, “ não temos em Portugal um parque habitacional para arrendamento a preços reduzidos, pelo que as pessoas, sobretudo os jovens, têm que recorrer ao mercado privado”.
Conclusões do 1º Painel:
1. Todas as políticas públicas nacionais e europeias que geram leis nacionais devem ser implementadas e adaptadas à realidade local, tendo em conta a dinâmica que existe num determinado território, de uma forma participativa, envolvendo todos os atores locais (privados, públicos e institucionais).
2. O paradigma do modelo de “bairro social” que serviu de base às políticas públicas de habitação em Portugal não é consensual. Há quem defenda que os bairros sociais devem continuar, necessitando de reabilitação e reconversão urbana. Há quem defenda que se devem matar de vez os bairros sociais porque estigmatizam quem lá reside e prolonga a pobreza por várias gerações, dificultando a mobilidade social. Pelo que se deve mudar radicalmente as bases em que assentam as políticas de habitação em Portugal.
3. É consensual que em Portugal há bairros sociais perfeitamente integrados no tecido urbano, com valor histórico e arquitetónico que têm de ser preservados e requalificados.
4. Acabar com os bairros sociais não significa acabar com a habitação social, mas assente em pressupostos distintos.
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