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Genoveva Dias Arcadinho Lúcio
O médico e os amigos incentivaram-na a arranjar uma ocupação para espantar a solidão que, com a morte do marido, teimava em lhe consumir os dias. E, desde então, Genoveva já conta com 21 anos de trabalho fora do lar. Primeiro, como empregada de limpeza no Hospital do Desterro, e atualmente, como encarregada de limpeza no edifício dos Paços de Concelho. Mas ao analisarmos o seu percurso de vida não são só as estatísticas que são uma exceção no seu caso, também a sua vitalidade não parece dar mostras de querer abrandar o ritmo de trabalho à medida que os anos vão passando por ela. No edifício dos Paços do Concelho não há quem ainda não tenha reparado em Genoveva que, apesar dos seus 80 anos, anda sempre apressada de um lado para o outro, envergando a sua bata amarela e com o pano do pó sempre à mão, numa azáfama à qual não dá folga porque ao sábado e ao domingo costuma ir ajudar o neto no restaurante. “Depois do encerramento do hospital podia ter optado pela reforma, tal como a minha filha me aconselhou, mas sinto-me melhor a trabalhar porque o faço por prazer e não por obrigação”, explica-nos D. Genoveva. Natural de Alcáçovas, Alentejo, Genoveva Dias Arcadinho Lúcio nasceu em 20 de fevereiro de 1933, numa época em a maior parte das mulheres não trabalhava fora do lar. As mais “prendadas” arranjavam um bom casamento e ficavam em casa a cuidar da família, a não ser que por ironia do destino ficassem à sua própria mercê. Era até considerado um privilégio casar com alguém que não aceitasse que a sua mulher ajudasse a ganhar o sustento para a família, mentalidade que era ainda mais vincada em aldeias e vilas por este país fora.
Quando tinha 11 anos, os pais separaram-se, e como Genoveva escolheu ficar com a mãe que estava de partida para Lisboa para trabalhar como doméstica, viveu na capital até aos 15 anos. Em Lisboa não continuou a estudar e quase não saía de casa. Passados três anos, a mãe achou que estava na hora de começar a pensar no enxoval, e como não tinha posses para a ajudar a organizar o mesmo, convence-a a regressar à terra natal. O pai não queria que Genoveva trabalhasse, apenas permitia que o ajudasse na venda/taberna de que era proprietário. Mas Genoveva queria ganhar o seu próprio dinheiro, e tanto pediu que o pai fez-lhe a vontade: aos 18 anos vai para o campo trabalhar, apanhar azeitona, bolota e carregar pedra. Manteve esta atividade até casar, aos 21 anos. O marido, militar de profissão, colocado na Marinha, embarca, passado um mês do casamento, numa viagem por Macau e Timor. Até que o marido regressasse, passados vinte meses, Genoveva continuou a viver em casa do pai, ocupando os seus dias com a lida de casa e os lavores de renda e malha, pois o marido também não permitia que trabalhasse fora de casa. Após o regresso do cônjuge, saem de Alcáçovas e estabelecem residência em Almada. Dada a profissão do marido, Genoveva continuava a passar longas temporadas sozinha, com a filha Mariana que entretanto nascera. O marido continuava em missão no Ultramar e quando a filha fez doze anos, em 1968, resolve levar a família para a Guiné. Regressaram todos em 1972.
Até 1992, data do falecimento do marido, Genoveva nunca tinha trabalhado fora de casa. Hoje, é uma cara indispensável no dia-a-dia de todos os que trabalham no edifício dos Paços do Concelho. Genoveva ainda continua a viver na outra margem do Rio, em Almada; a sair todos os dias de casa por volta das 04h50 e a entrar na Câmara antes das 07h00 da manhã. Na sua vida tem mostrado que sabe adaptar-se às marés, mesmo quando estas ameaçam a tranquilidade da sua viagem.
C - Boletim Municipal | 20 de junho de 2013