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O molho enrola na Areia

A mesa estava posta, a Mila tinha adiantado o almoço: salmão com batata cozida. Mas faltava algo. A EB1 da Areia Guincho recebia o chef Luca Bordino que havia de trazer alguma coisa para aquela refeição ser diferente. E não é que trouxe mesmo?

Daniel e Rodrigo são “grandes amigos” e “de longa data”, assevera Daniel. “Desde a pré-primária”, precisa o Rodrigo. “Ninguém diria” intromete-se Ella, amiga comum e conhecedora desta vetusta amizade: “são o contrário um do outro”. Bom, enquanto Rodrigo vazava um prato de sopa boca a baixo, como se abrisse um buraco no prato e o creme de legumes se escapulisse, o Daniel não. O Daniel fazia render a coisa. Levava a colher à boca com tal cerimónia que punha os colegas a abrir igualmente a boca, mas de ansiedade.

Decididamente Ella tinha toda a razão: Eram o oposto. Se um era carne, o outro seria peixe. Mas se a sopa tinha sido devorada com mais ou menos ligeireza o que vinha a seguir era peixe. E, como sabemos, o peixe não goza de boa fama na pequenada das bandas da Areia. Consta aliás que não é só ali. Como é que, então, o nosso chef Luca Bordino se ia desenvencilhar?   

Longe deste momento de reflexão gastronómica Luca Bordino tinha a solução. Ó Maria Emília (Mila na intimidade deste universo de tachos e panelas), venha daí o limão e o alho e, já agora, também a manteiga, e as ervas, e o tomilho e a salsa, mais o cebolinho e ainda o iogurte e o caramelo. Caramelo? Sim, caramelo teria dito Luca Bordino se este diálogo não fosse ficção. Ficção no diálogo que não nos ingredientes e no resultado final: três molhos, agre e doce, ambos derramados, ora no peixe, ora nas batatas. E não falamos aqui das doses, das misturas e dos segredos. Porque os molhos têm os seus segredos e estes três, que o chef Luca preparou tinham o segredo de não embrulhar sabores, apenas esconder os mais fortes e salientar dois: o agre dos citrinos e o doce do caramelo. E, às suas cavalitas, apresentarem ainda outros que ajudaram a reduzir o tempo de permanência no palato da pequenada, dos sabores maiores. E Luca explica: “O palato da criança não está treinado e, por isso, não devemos utilizar sabores muito intensos, muito fortes, que se prolonguem muito tempo na boca. Só se devem trabalhar os dois grandes sabores: o ácido e o doce. São mais simples de distinguir. Foi o que fiz aqui. Trabalhei com os citrinos e com o doce do iogurte e do caramelo”.

A cultura gastronómica do chef não é indiferente a esta preferência pelo agre e doce. Apesar das origens que o nome e apelido destapam – Itália, o país das pastas e das massas – Luca viajou pelo continente asiático onde bebeu muito da sua riqueza cultural.

Apenas esconder o sabor do peixe e da batata? Porque não juntar apenas esses produtos? “Porque a melhor maneira de se introduzir sabores diferentes às crianças é não tocar no prato visualmente. Se as crianças virem alguma coisa no prato que não estão habituadas a ver, isso pode criar a entropia ao ponto de nem quererem provar. Por isso, mais vale não inventar muito e trabalhar só com os sabores. É muito mais fácil fazer com que a criança prove um alimento que já conhece visualmente”, explica o chef.

Em suma, se na lição gastronómica aos 150 alunos da EB1 da Areia Guincho, Luca Bordino enrola sabores, e quebra alguns mitos gastronómicos, em sumário deixa outros para quebrar num futuro próximo: “comemos alimentos demasiado quentes, devemos reduzir o consumo de glúten e temos de personalizar a ementa, porque não temos todos as mesmas necessidades”. Aí está uma boa dica para voltar à conversa de Ella sobre a amizade do Daniel e do Rodrigo. “Grandes amigos mas completamente diferentes”.

 

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