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CE 2019 | "A Europa tem de alavancar o seu poder no mundo", disse Fareed Zakaria

Fareed Zakaria é considerado um dos conselheiros de política externa mais influentes da sua geração e o seu programa na CNN com assinatura própria, é uma referência mundial sobre o panorama político atual. Quem melhor do que ele para dar à audiência das Conferências do Estoril um “retrato” global do nosso mundo?

Fareed Zakaria começa com uma provocação: “ Estamos num mundo louco dos populismos, de Trump e do Brexit. Há quase um elemento circense que descreve aquilo que se está a passar. Parece que ser comediante é um requisito para se entra hoje na política”.

Mas, o jornalista americano, nascido em Bombaim, na India, não segue a linha do pessimismo dominante. “ As coisas não estão tão más como as pessoas julgam. Até o Trump não conseguiu fazer grande coisa. Para seu desgosto não conseguiu por de pé o muro. Limitou-se a baixar os impostos”, afirmou.

Quanto à ascensão do populismo no ocidente, Fareed analisa as causas:    

“ Hoje temos uma sociedade tribal bipartida. De um lado temos aqueles que vivem nas cidades, nos grandes centros de desenvolvimento onde há crescimento e empregos e que têm um grau académico. Estão sempre ligados e entendem a linguagem da economia digital, onde é o cérebro, e não os músculos que conta mais. Por outro lado, existem os mais velhos, menos instruídos, com profissões que estão a ser substituídas por tecnologia e que não entendem essa classe média mais jovem e que falam a linguagem tecnológica. “

E Fareed dá o exemplo: “ Na América existem 3 milhões de pessoas que ganham a vida a conduzir autocarros e camiões. São homens sem formação universitária. Qual vai ser a reação dessas pessoas face à tecnologia que os vai substituir com os carros autónomos? Estes são os excluídos da era tecnológica que vêm com desconfiança todas as mudanças operadas na sociedade e na economia. O drama está nas profundas diferenças entre essa classe média urbana e instruída e a classe trabalhadora branca que foram excluídos nesta nova ordem económica. “   

“Esses excluídos são a base do eleitorado de Trump”, afirmou Fareed que acrescentou” Trump tem um discurso de identificação com esse eleitorado, ao afirmar que “as suas vidas estão difíceis porque os mexicanos lhe roubam os empregos, os chineses lhes ocupam as fábricas e os muçulmanos estão a matar-vos”.  

Este discurso anti-imigrantes que defende uma sociedade fechada também está a crescer na Europa. E porquê? Fareed responde:

“ Não é possível fazer pontes ou criar compromissos quando vivemos numa perspetiva tribal em que não queremos ouvir o outro, nem nos  queremos colocar na sua pele. Apenas queremos ouvir o que nos interessa, com quem concordamos e quem apoia as nossas ideias.”  

Mas, Fareed está otimista: “ a ascensão desta visão pessimista do mundo que permitiu a ascensão dos populismos só acontece porque são os mais velhos a votar e que vivem na ansiedade e no medo. Os mais jovens querem uma sociedade aberta e votam com esperança e aspirações.”

Assim concluí: “ Vamos ficar bem quando os jovens chegarem ao poder, temos é que garantir que não explodimos o mundo antes”.   

Apesar dos ataques do Trump as instituições liberais são fortes, mas se ele continuar por mais cinco anos, não sei o que vai acontecer.

No que se refere à Europa, Fareed forneceu igualmente uma visão muito interessante do panorama global:

“ Não há solução para os problemas da Europa que não envolvam mais Europa, ou seja mais cooperação na resolução das questões globais como o problema da imigração”.

O jornalista, conhecido pelas suas posições polémicas, defendeu ainda que os movimentos nacionalistas e os defensores do Brexit só têm retórica, mas não têm soluções: “ É como estar à beira do precipício, olhar lá para baixo e saltar para o abismo”.

Como virar a mesa? Perguntou o jornalista José Rodrigues dos Santos.

Fareed respondeu com a provocação que lhe é conhecida: “ Os que são pro Europa deixaram de ter capacidade de explicar o que é a Europa e de chegar ao coração das pessoas. Insistem numa narrativa monótona sem utopia. Já os populistas souberam como chegar ao coração das pessoas e darem-lhe algo romântico que as anime.  

Mas, para o perito em política internacional, “é fundamental que a Europa resolva a questão do euro. A Europa impôs a moeda única mas não se preparou para isso, designadamente os países do sul a quem impuseram a austeridade e a estabilidade germânica, em vez de maiores transferências monetárias para compensar o facto de não poderem desvalorizar a sua moeda em situações de recessão”. Por isso deixou o recado: “ Sem uma grande união fiscal e maiores transferências de recursos a moeda única é um desastre”.  

No que se refere ao papel dos Estados Unidos da América no novo panorama global, Fareed Zakaria concluiu:

“ Após 1945 e durante 75 anos, todos os países europeus conheceram a paz e a estabilidade porque os americanos providenciam a segurança e a paz na Europa. Mas, agora a Europa tem que pensar a questão da defesa de uma forma mais séria.”

E voltou a salientar: “ É preciso mais Europa, mais coordenação entre os países europeus e uma melhor política de defesa. A Europa gasta muito em defesa mas de forma ineficiente. A Europa precisa de se projetar mais no mundo,  investir na sua “cibercapacidade”, olhar para o espaço como os chineses”.

Em resumo, “ A Europa tem que deixar de se centrar no seu umbigo. E alavancar o seu poder no mundo como força liberal”   (PL)

 

CONFERÊNCIAS DO ESTORIL | Organizadas a cada dois anos, com o compromisso de promover debates racionais e escolhas informadas, as Conferências do Estoril vão na sua sexta edição procuram soluções locais para desafios locais. A organização da edição 2019 está a cargo do Estoril Institute for Global Dialogue, Câmara Municipal de Cascais e Nova School of Business and Economics com a parceria de diversas entidades e voluntários (mais info)

 

  

 

 

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