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FIC: A literatura muda mentalidades?

"Literatura e revolução de mentalidades" foi o tema de mais um debate ao abrigo do Festival Internacional de Cultura de Cascais. A sessão decorreu no Auditório Maria de Jesus Barroso da Casa das Histórias Paula Rego, e teve a participação de Lídia Jorge, Guilherme d'Oliveira Martins e Pedro Mexia, tendo sido moderada por José Carlos Vasconcelos.
Lídia Jorge iniciou a sessão ao afirmar que, "existem poucas dúvidas acerca da capacidade da literatura mudar mentalidades", dando o exemplo de Napoleão, que "proibiu a leitura de "Os Sofrimentos do Jovem Werther", de Goethe, porque acreditava que tornava os soldados mais suaves em tempos de guerra, além do aumento registado de suicídios que decorreu na Europa", motivados pelo tema da obra.
 
A escritora portuguesa, a curadora da anterior edição do FIC, deu o exemplo de "A Cabana do Pai Tomás", de Harriet Beecher Stowe, editado em meados do séc. XIX: "foi alvo de um comentário do presidente Lincoln, que disse à autora que a Guerra da Secessão tinha sido provocada por essa obra. Teve uma grande força na tomada de consciência do estado da escravatura - e assim foi durante mais 100 anos. Nos Estados Unidos, "Pai Tomás" tornou-se sinónimo de "cobarde", daquilo que os negros americanos não deveriam ser. A literatura tem efeitos diferentes em alturas diferentes da História", concluiu.
 
Guilherme d'Oliveira Martins acrescentou: "quando hoje lemos "A Voz do Profeta", de Alexandre Herculano, quase nos esquecemos que é uma manifestação política. Também Sophia de Mello Breyner, com "Mar Novo", reuniu poemas numa altura (1958) de importantes episódios, como o surgimento da Livraria Morais e a candidatura à presidência do General Humberto Delgado. É um livro de rutura e revolta contra as injustiças." O político e jurista disse ainda que, "quando lemos um texto, percebemos que identifica e traduz a realidade que nos cerca, para o bem e para o mal. A literatura está sempre em relação com a vida."
 
​Já Pedro Mexia cedo anunciou a sua posição como "advogado do diabo", ao não estabelecer "nenhuma relação com a literatura, que mude mentalidades". O poeta e crítico literário citou a lista de livros que a New York Public Library​ afirmou terem mudado o mundo: "muitos deles não são literatura, como os casos das obras de Darwin, Marx e Hersey. "Os Irmãos Karamazov", de Dostoievski, mudaram menos mentalidades que qualquer campo Gulag." Defendeu ainda que, "os livros mudam o mundo, mas não tanto a literatura de romance. Os que mudam são de intervenção política, como o "Manifesto Comunista" ou "O Pequeno Livro Vermelho", de Mao Tse Tung."
 
​Antes do final do debate, a que se seguiu uma homenagem a Lídia Jorge por parte da Câmara Municipal de Cascais, Mexia disse ainda não acreditar que "todos os livros mudem mentalidades - ou que sejam bons, sequer. O meu livro favorito português é "Mau Tempo no Canal", de Vitorino Nemésio, mas não tenho conhecimento de ter mudado mentalidades. Este critério não é essencial para a importância das obras, e deixaria muitos grandes livros de fora."

Cascais Digital

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